Fazenda da Cachoeira, um
testemunho vivo da história de Caldas.
A história da colonização do
município de Caldas começou com a criação de gado, a princípio criado como
moeda de troca e posteriormente para a ordenha e corte, assim começou os
primeiros movimentos da economia do município, sempre tendo o gado e os campos
naturais como sustento para esses animais. Tudo isso começou a bem mais de 200
anos atrás, testemunhos vivos dessa época seria então impossível¿ Não, na
Fazenda do Retiro! Uma fazenda que nos leva a uma verdadeira viagem ao passado.
Imagine uma fazenda, com base de
pedras, paredes de pau a pique, a seu redor um enorme curral de pedras e
madeiras e pequenas casinhas, também de pau a pique para guardar mantimentos,
paiol de madeira, com chiqueiro embaixo, claro também de pedras feito por
escravos! E tudo mais como casa de colono, roda d’água para gerar energia,
mujolo para fazer canjiquinha e por aí vai. O tempo já corroeu boa parte destas
benfeitorias, mas uma considerável parte esta lá intacta, como há 124 anos. A
Fazenda não é a mais antiga do município, existem outras ainda mais ancestrais,
como a Fazenda Ribeirão Fundo que também ainda esta de pé em pleno vapor e é
datada de 1851 e há ainda outras mais antigas como a Fazenda do Capivari. Mas o que
chama a atenção na Fazenda da Cachoeirinha é o modo como tudo é feito,
principalmente o retiro ainda manual, com vacas, guzerás e caracus que segundo
o Sr, Virgilio herdeiro da fazenda, essa espécie de gado foi escolhida devido à
resistência e por se adaptar melhor aos campos naturais. Virgilio é filho do
Antônio José melo, o saudoso Toquinho que adquiriu a fazenda de um tio avô,
Pedro Severiano França (Pedro Cuta), o fundador da fazenda em 1889.
O dia na fazenda começa no raiar
do dia, as vacas estão soltas pelo pasto, boa arte ainda campos naturais. O
cachorro e os gritos do Sr. Virgilio e seu enteado e braço direito “Dione”
trazem elas até o curral. Os bezerros estavam em outro pasto, mas nessa hora já
estão berrando ao redor esperando pelo leitinho_ Uma teta cheia de leite, essa
é forma de partilha, três para o retireiro e uma para o bezerro, parece injusto,
mas, é mais que suficiente para saciar a fome do bichinho.
Os bezerros são amarrados nas
patas dianteiras da vaca, o leite é retirado num balde, vaca boa enche o balde
de 12 litros. Se a vaca for de primeira cria e ainda não estiver acostumado com
a rotina do retiro, usa-se o cambão, que é uma madeira com uma corda na ponta
usada para amarrar a vaca enquanto o vaqueiro a segura em outra ponta. Tem que
ter braços fortes e coragem para segurar a vaca com seus chifres afiados, essa
casta de vacas é conhecida pelos enormes chifres encurvados, na fazenda esses
chifres que são preservados ao contrário de outras fazendas onde as vacas são
escornadas para evitar acidentes e facilitar o manejo.
Como em qualquer retiro, há
sempre uma garrafa de café com uma caneca que pelo menos em dois intervalos da
ordenha é cheio com leite retirado na hora, literalmente aos pés da vaca. Outra
cena no mínimo inusitada, para quem nunca acompanhou um retiro é o banco de
madeira, amarrado por uma borracha ao corpo do retireiro, assim ele nunca cai,
mesmo que a vaca se movimente.
Segundo Virgílio, a fazenda
intercalou a venda do leite in natura com a produção de queijo no decorrer dos
seus 124 anos de existência. No entanto, a forma de produção nunca se alterou,
houve os momentos de auge da fazenda, quando tinha no mínimo três famílias de
colonos que viviam e trabalhavam na fazenda, eram mais de 150 vacas, para ser
ordenhadas, manejadas e apartadas e havia ainda os trabalhos intrínsecos de uma
fazenda. Hoje somente dois são mais que o suficiente para cuidar das 40 vacas
restantes. Embora o trabalho ainda seja muito, boa parte do trabalho que antes
era feito manualmente na fazenda, hoje é mecanizado, ou mesmo produtos que
antes era cultivado, colhido e beneficiado na própria fazenda, como o arroz,
por exemplo, que era colhido e limpo ali mesmo no mujolo, hoje é adquirido no
mercado já limpo, pronto para o preparo. Muita coisa mudou no decorrer da
história da fazenda, assim como, tudo muda, mas testemunhar uma forma de
trabalho que atravessou o século sem nada mudar é no mínimo uma experiência
enriquecedora e que nos leva a mudar a percepção do olhar e do pensar em
relação à cultura, tecnologia e consumo.
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